sexta-feira, 26 de junho de 2015

Investigação sobre história do comércio swahili em Moçambique

UM grupo de pesquisadores da Universidade Complutense de Madrid vai realizar uma investigação sobre o comércio intercultural swahíli na ilha das Quirimbas, durante o primeiro milénio, ao longo da costa da província de Cabo Delgado, no norte de Moçambique.
“O nosso objectivo principal é investigar como foi o processo comercial swahíli na região, analisando as influências culturais que os povos autóctones sofreram”, disse à LUSA Marisa Ruiz-Galvez, investigadora espanhola e líder da equipa, que apresentou recentemente uma conferência sobre arte rupestre africana em Maputo.
Antes da presença dos portugueses no século XV, por volta do século VI, a zona costeira do território moçambicano, principalmente no norte do país, foi palco do comércio mercantil árabe, que teve início com a chegada dos primeiros navegadores estrangeiros, vindos maioritariamente da Ásia.
De acordo com os pesquisadores, a escolha de Moçambique para a pesquisa está relacionada com o facto de o país ser pouco explorado a nível de estudos arqueológicos, principalmente no que diz respeito ao comércio swaíli na zona norte.
“Seria muito interessante percebermos como funcionavam as sociedades indígenas, tanto na costa como no interior, e, tendo em conta que estas especificidades nunca foram estudadas em Moçambique, achamos que é um campo muito fértil para ser explorado”, acrescentou Jorge Torres, pesquisador e catalogador de arte rupestre africana no British Museum de Londres.
Os primeiros comerciantes árabes que chegaram ao território moçambicano traziam panos, vidros, missangas, sal e objectos de metal, e em troca os povos da região devam-lhes ouro, óleo de palma, cornos de rinocerontes, pele de animais e marfim, num contacto que deixou como legado aos povos autóctones os hábitos, culturas e crenças religiosas proveniente do mundo árabe.
“Nós queremos perceber se o contacto entre os povos locais e os povos comerciantes fez com que os povos locais salvaguardassem os seus valores étnicos ou, pelo contrário, condicionou a que estes perdessem os mesmos”, reiterou Vítor Fernández, integrante da equipa da Universidade Complutense de Madrid e que trabalha em África há mais de 20 anos, em pesquisas arqueológicas.
As pesquisas preliminares feitas por arqueólogos locais indicam que existem elementos importantes nas zonas costeiras do norte de Moçambique e que podem ser explorados. Entretanto, segundo Jorge Torres, é preciso que haja uma boa gestão de expectativas, na medida em que a área ainda não foi profundamente pesquisada.
“Antes de mais, se realmente existem tais artefactos, precisamos saber de que período são, porque nós estamos interessados principalmente no primeiro milénio e no processo de formação dessas sociedades”, afirmou Jorge Torres, lembrando que um arqueólogo nunca sabe especificamente o que vai encontrar.
Numa primeira fase, com apoio de arqueólogos moçambicanos da Universidade Eduardo Mondlane (UEM), a equipa fará o reconhecimento do local, como forma de se familiarizar com o campo de estudo, e num segundo momento, nos próximos meses, os pesquisadores voltarão para iniciar as pesquisas.
“África tem um enorme potencial arqueológico, entretanto, é necessário que sejam realizados mais trabalhos do género, como forma de explorar este potencial”, enalteceu Vítor Fernández, apontando para a expansão bantu, movimento de povos africanos através do rio Benue-Cross, no sueste da Nigéria, em direcção à zona austral de África durante três milénios, e o império Monomotapa, entre 1430 e 1760, como marcos importantes para estudos arqueológicos.
“Diferente do que se pensa no estrangeiro, as sociedades africanas são povos muito complexos e com uma diversidade cultural muito forte, o que enriquece os estudos arqueológicos”, salientou Marisa Ruiz-Galvez, destacando, a título de exemplo, o Império Marave, formado entre 1200 a 1400 nas proximidades do rio Zambeze, e que se dissolveu, entre vários factores, com a penetração mercantil portuguesa no vale do Zambeze, a partir do século XVI.
O projecto, desenvolvido em cooperação com a UEM e com o apoio do Governo moçambicano, tem um prazo de três anos e vai ser financiado pelo Governo de Madrid, através do Ministério de Economia e Competitividade.








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