A escritora marfinense Véronique Tadjo vai lançar no
próximo sábado, na União dos Escritores Angolanos (UEA), em Luanda, a sua obra
literária intitulada "A sombra de Imana", a ser apresentada pelo
ensaísta angolano Luís Kandjimbo.
O livro, uma co-edição da UEA e da Texto Editora, traduzido em português uma sátira ao genocídio ocorrido no Rwanda, de 6 de Abril a 4 de
Julho de 1994.
Para Véronique Tadjo, A Sombra de Imana é uma prova da capacidade da literatura em dar um novo olhar
sobre o passado e ajudar as pessoas a reaprenderem a viverem juntas e em
harmonia”.
A sombra do Imana, que escreveu depois
das suas duas estadas na capital rwandesa, Kigali (1998 e 1999), é resultado
dessa experiência. A primeira parte fala do contacto com os Rwandeses e da
descoberta dos lugares do genocídio. A segunda parte centra-se nas questões
relacionadas com a natureza humana, como, por exemplo, a ignorância que
manifestamos em relação ao nosso eu: quem somos e o que somos capazes de fazer?
Para Tadjo, era importante fazer estas perguntas, porque a barbárie dos
massacres, «o Ruanda está em cada um de nós».
O problema étnico é
real no continente africano. Tadjo diz que, como escritora, não pode ignorá-lo.
Tanto mais porque na raiz da profunda crise que a Costa do Marfim enfrenta está
o conceito de «ivoirité». Este termo foi criado pelo antigo presidente
costa-marfinense Henri Konan Bédié, em 1995. O sentido que lhe quis dar foi o
da identidade cultural comum a todos os que vivem na Costa do Marfim, apelando,
especialmente, aos estrangeiros, que representam um terço da população. Mas,
posteriormente, frisou-se a questão de quem é da Costa do Marfim e quem não é.
Ou seja, quem é costa-marfinense de verdade. E, presentemente, ivoirité está
associado à actual guerra civil étnica.
A ideia de legitimidade atribuída aos nacionais e consequente exclusão dos
estrangeiros tem fracturado a sociedade da Costa do Marfim. No entanto, o país
prosperou em grande parte graças à força de trabalho de imigrantes, oriundos
principalmente de Burkina-Faso, Mali e Guiné. Estes instalaram-se e os filhos
deles nasceram no território. Então, a questão de identidade e a pergunta «Como
podemos viver juntos hoje?» inspiraram Véronique Tadjo a escrever Reine
Pokou, concerto pour un sacrifíce, em 2005. Esta obra valeu-lhe, nesse ano,
o Grand Prix Littéraire d’Afrique Noire.
Poeta,
romancista e autora de livros infanto-juvenis, que ela própria ilustra. Dá vida
ao seu sonho de contribuir para o surgimento da literatura africana para as
crianças, reinterpretando mitos e lendas e analisa pessoas e acontecimentos de
hoje à luz dos heróis antepassados.
Filha de mãe francesa
e pai costa-marfinense, Véronique Tadjo, 60 anos, doutorada em Civilização
Afro-Americana pela Universidade de Sorbonne, Paris IV, é poeta, romancista e
ilustradora. Nasceu em Paris, cresceu na Costa do Marfim, vive na África do
Sul.
No seu romance, Loin de mon père
(«Longe do meu pai»), editado em 2010, aborda o difícil retorno de uma costa-marfinense
ao seu país natal por medo do peso da tradição.
Não é uma obra
autobiográfica, embora pudesse sê-lo. Véronique Tadjo leva uma vida errante: já
passou pela Nigéria, Quénia, Estados Unidos, México e Grã-Bretanha, até que se
instalou em Joanesburgo, na África do Sul. Vive longe de Costa do Marfim desde
1993.
Em Loin de mon
père, ela conta a história de Nina, uma jovem mulata que decidiu morar em
França, o país da sua mãe. Após uma longa ausência, ela retorna à sua terra
natal, onde cresceu. Todavia, a Costa do Marfim mudou e Nina acaba por se
sentir estrangeira na sua pátria.
Por outro lado, em Reine Pokou, a
escritora analisa igualmente a natureza do poder e da violência. O sacrifício
de Pokou poderia ser comparado ao das mulheres a quem é pedido, tantas vezes,
que «sacrifiquem» os seus filhos, enviando-os para a guerra em nome de uma
«causa justa». Hoje, Tadjo interroga-se se as crianças-soldados não são uma
ilustração contemporânea desse sacrifício.
Segundo a lenda, a
rainha Pokou foi obrigada a fugir do grande reino ashanti (no actual Gana) após
uma guerra de sucessão. Quando, na fuga, ela e o seu séquito tiveram de
interromper a marcha ao depararem com um rio grande, o Comoé, os adivinhos
pediram a Pokou que lançasse o seu filho às águas, a fim de salvar o seu povo.
E foi isso o que ela fez. As águas separaram-se e a comitiva pôde avançar. Mais
tarde, Pokou fundou o reino baulé (termo que deriva de «baouli», que significa
«o menino morreu»).
Historicamente, os
antepassados dos Baulé têm raízes para lá das fronteiras da Costa do Marfim,
contudo, eles são reconhecidos como os costa-marfinenses por excelência. Isso
leva a relativizar a ideia de pertença étnica. Comenta Tadjo: «A personagem da
rainha Pokou suscitou-me várias perguntas: será Pokou uma heroína ou uma mulher
disposta a fazer qualquer coisa para conseguir o poder?» E acrescenta: «Pokou
fez-me pensar sobre quem são os nossos heróis e se eles merecem sempre o
estatuto de herói. É uma pergunta que continuo a fazer no novo romance que
estou a escrever, mas esta história foca mais o tema da transformação pessoal.»
Tadjo encontra uma grande liberdade de
expressão na literatura infanto-juvenil. Nos seus dez livros para crianças,
foca temas que o público adulto pode encontrar nos seus romances e poemas.
Simplesmente, trata-os de outro ângulo. Por exemplo, no livro Ayanda,
la petite fille qui ne voulait pás grandir (2007) fala da
guerra e da dificuldade de superar a perda de alguém a quem se quer como a um
pai. Ayanda recupera a alegria de viver apenas indo ao encontro dos outros. E a
obra mais recente é Mandela, non à l’apartheid.
A própria Tadjo ilustra a maior parte
dos seus textos, porque acredita que isso lhe permite criar um universo
coerente. O desenho torna-se outra forma de escrita, mais directa, mais física.
As imagens são, em si mesmas, independentes. Doam algo.
O seu segundo livro, Mamy Wata
et le monstre, ganhou o Prémio UNICEF em 1993.
angop, além-mar
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