Cento e onze
anos após o genocídio de Hereros e Namas de Janeiro de 1904, um dos episódios
mais negros da História de África, continua pouco conhecido. A romancista francesa
Élise Fontenaille-N'Diaye publicou dois livros essenciais que recordam os
factos.
Baseado nos testemunhos
contidos no relatório (Blue Book) sobre
o genocídio, cujo único exemplar de 200 páginas se encontra numa biblioteca pública
de Pretória, África do Sul, a romancista francesa, usando o mesmo título Blue Book em apenas 49 páginas, denuncia
a amplitude do primeiro genocídio do seculo XX, antes dos arménios, dos judeus,
dos tutsis.
O outro livro, um romance
destinado à juventude, é intitulado Eben ou les yeux de la nuit. Élise
Fontenaille-N’Diaye lamenta que “pouca gente conhece esta história. Pouca gente
quer falar sobre o assunto. Não há um museu, nem um lugar em memória das
vítimas, apenas alguns historiadores abordam o tema, a titulo individual”,
Tal como Anne Poiret no
seu documentário Namibie: le génocidie du
IIe Reich, divulgado há dois anos, Fontenaille-N’Diaye sustenta a tese
segundo a qual o sudoeste africano foi de certa forma o “campo de preparação
dos futuros nazis”
No dia 12 de Janeiro de 1904, os Hereros revoltaram-se contra
os colonizadores alemães, que durante
20 anos, expandiram o seu domínio usando a táctica de alimentar as rivalidades
entre os povos bantu daquela região.
Os Hereros, que viviam basicamente da pecuária, foram perdendo os seus
campos para os colonizadores alemães, através de negociações, falcatruas e
violência. A situação chegou a tal ponto que o chefe, Samuel Maharero, apelou
ao seu povo e a outras tribos para resistirem à dominação alemã.
Numa carta ao líder Namas, Hendrik Witbooi, escreveu: "Toda a nossa
subserviência e paciência em relação aos alemães não trouxe vantagens. Por
isso, faço um apelo, meu irmão, para que participes na nossa revolta, de modo a
que toda a África levante as armas contra os alemães."
O sonho de Maharero não se concretizou, pois os Namas não aderiram ao seu
apelo. No dia 12 de Janeiro de 1904, os guerreiros comandados por Samuel
Maharero atacaram e massacraram os colonos do posto de Okahandja. O Império
Alemão reagiu com extrema brutalidade.
O imperador Guilherme II mandou para o Sudoeste Africano, 3500 soldados
comandados pelo general Lothar von Trotha. Numa carta ao governador da colónia,
Theodor von Leutwein, anunciou a repressão: "Conheço muitas tribos
africanas…Terror, violência brutal. Essa é a minha política", escreveu.
A 11 de agosto de 1904, tropas alemãs comandadas por Von Trotha cercaram
7500 hereros e o seu chefe, Samuel Maharero, com armas poderosas. Sobreviventes
do massacre foram expulsos com os seus animais para o deserto do Kalahari.
Alguns fugitivos escaparam para o território do Botswana ocupado pelos
britânicos. Outros tentaram voltar para as suas povoações de origem, mas von
Trotha foi implacável. A 11 de dDezembro de 1904, foi ordenada a concentração
dos Hereros sobreviventes em campos de trabalhos forçados e, pouco depois, as
últimas terras indígenas foram confiscadas e colocadas à disposição dos colonos
alemães.
Nos três anos seguintes, dezenas de milhares de Hereros sucumbiram à
repressão, à fome e às doenças. Apenas cerca 15 mil de um total de 90 mil Hereros escaparam do genocídio. O domínio alemão ainda persistiu por mais uma
década.
Em 1915, durante a Primeira Guerra Mundial, a actual Namíbia foi ocupada
pela África do Sul, na época colónia britânica. Em 1920, a Liga das Nações deu
à África do Sul um mandato para administrar o território, situação que perdurou
até ao final da década de 80.
Em 1966, eclodiu a luta de libertação com o início da luta de guerrilhas,
organizada pela SWAPO (Organização dos Povos do Sudoeste Africano) que culminou com a independência da Namíbia em 21 de Março de 1990.
Jeune Afrique, esquerda net
Sem comentários:
Enviar um comentário