Texto de Frederico Jamisse
Sereno, trabalhador,
metódico e sempre bem disposto, é o mínimo desfile de adjectivos que podemos
usar para caracterizar o “Leão de África” – o saxofonista camaronês Manu
Dibango.
Conversamos com Papa
Manu (como carinhosamente o tratam os mais próximos), em París- França, onde
ele vive. Uma conversa faseada que foi sendo feita em sua casa, nos
restaurantes por onde almoçamos ou jantamos com ele, assim como no Studios
Ferber, onde ele e o músico Moreira Chonguiça privaram durante dias, gravando
um disco.
Atencioso, fez questão
de nos receber logo à chegada. E a primeira refeição, depois da saudação, foi
em sua casa. Peixe com legumes. O peixe chama-se Sol of Cameron (um peixe muito
popular nos Camarões). Aliás, em Dualá, terra onde Manu Dibango nasceu come-se
mais peixe do que carne.
MÚSICO PARA TODAS AS
CLASSES
Manu Dibango
cultiva o hábito de trabalhar e praticar sempre. Pois segundo ele, só assim se
consegue criar e alcançar o sucesso. Suas músicas alcançam vários públicos.
“Há uma parte de mim
que não é conhecida em África, um lado musical diferente e calmo. Os
africanos gostam de música para dançar e você não toca jazz para eles ouvirem,
mas para os pés e não para a cabeça”, afirma Dibango.
Sempre disposto a
trabalhar, Manu é apologista de uma cultura de trabalho e aproveitamento das
oportunidades. “Se tiveres oportunidade de fazer, o melhor é fazer
porque nunca sabemos do amanhã. Em 1983, gravei o disco de música mais
calma, Soft And Sweete fiz também para Cartoon - desenhos
animados”.
Dos ritmos de Camarões,
Manu Dibango alcançou a universalidade. “ Eu sou um músico que vem de
África. Não um músico africano porque toco para o mundo”.
África produz talentos,
mas ainda há muito por fazer. “ É tempo de começar a pensar no
continente africano. Temos muitos problemas por resolver. É preciso pensar para
frente e sermos exemplares. Procurar soluções dos problemas africanos em África”.
Manu Dibango olha para
África com esperança, embora tenha reticências, a avaliar pelo que já fez. “Sou
Padrinho de muitos projectos em Camarões. Já investí muito e não
tive resultados. Mas é o nosso país, nosso continente e a nossa
responsabilidade é fazer o que deve ser feito”.
Segundo o “Leão de
África”, a cultura é uma parte que pode fazer sobressair África.“Mas há
muito mais para ser feito. É preciso pensarmos na maneira correcta de
aproveitar os nossos recursos humanos e naturais. Temos que capitalizar a
agricultura, criar indústrias fortes e capazes”.
MOÇAMBIQUE É UM PAÍS
IMPRESSIONANTE
Manu Dibango escalou
Moçambique pela primeira vez, no ano 2012, através da More Promotions. Veio
participar na segunda edição do More Jazz Series.
Fazendo-se acompanhar
pela sua banda Soul Makossa Gang, Manu actuou no Hotel Polana e fez
encerramento da FACIM, em Ricatla-Marracuene. Aliás, nos dias 30 e 31 de
Outubro corrente, Manu Dibango, estará em Maputo para participar na quinta
edição do More Jazz Series, no Hotel Polana e na baixa da cidade, JAT5.
“Em Moçambique fiquei
impressionado pelo facto de ser um país diferente. Rodeado de anglo-saxónicos,
vocês são colónia portuguesa com um tique universal”, afirma Manu Dibango.
Questionado sobre a
música moçambicana, Dibango afirma: “Conheço muito pouco a música
moçambicana. Aqui em França, temos músicos cabo-verdianos e angolanos, em parte
por causa da Total”.
Conheceu Moreira
Chonguiça e a paixão de juntos trabalharem brotou com facilidade. “Conhecí
este jovem e decidimos gravar juntos um álbum que se chama M&M. Um álbum
universal mas com timbre africano. É maravilhoso trabalhar com ele”.
Manu afirma ainda sobre
o M&M que : “Tocar com Moreira foi uma experiência ímpar. Eu nunca
tinha tocado assim e acredito que ele também. Mas antes de tocar é
preciso existir conectividade. Eu venho de Camarões e ele de Moçambique. Isto é
que é União Africana”.
QUEM É MANU DIBANGO?
Manu é um
saxofonista de jazz e afrobeat. Ao longo da sua carreira teve várias
colaborações com músicos africanos e de outros continentes.
Soul Makossa é o nome da
sua banda. Coincidentemente, Makossa é o título da sua música mais famosa.
Makossa é um estilo musical de Camarões, cujo trecho foi utilizado para
combinações em músicas de variados ritmos.
“Vim viver em Paris
nos tempos complicados. Mas não vim como imigrante. Vim com passaporte porque
meu pai pagou”.
A carreira de músico nem
sempre foi coroada de coisas . “Tive problemas porque meus irmãos
eram engenheiro e advogado. E meu pai sempre perguntava: e você, vai ficar na
música? Mas fiquei famoso e meu pai ficou orgulhoso. E ser músico é um desafio.
Todas as noites você gasta dinheiro e por vezes é obrigado a conviver com
pessoas más. É a vida de artista”
Centenas de concertos e
prémios diversos marcam os 82 anos de vida de Manu, muitos dos quais passados
na música, em estúdios e em tournés. “Marcou-me bastante a actuação que tive
em 1999, quando toquei no Vaticano com a minha banda. Era semana católica”.
A música tem estado a
ganhar outros contornos. Uns fazem-na em poucos segundos em estúdios
electrónicos. Mas existem os perfeicionistas. Manu é um deles.“A música é
funny mas é séria. Não se pode pensar fazer a música apenas por fazer. É
preciso ouvir música de vários países e de outros artistas para ter a
percepção. Também é preciso ensaiar e praticar muito, adverte Papa Manu”. Em
termos de discografia, Manu Dibango já produziu dezenas de ábuns.
jornal domingo